No dia 14 de dezembro de 2010 entre 18h e 20h choveu torrencialmente na região da
Fazenda da Barra. Passamos duas horas entretidos recolhendo água de algumas goteiras crônicas
naquela época, lembro de ter tirado vários baldes de água. Às 20:30 h já estava escuro e saí para
fechar a porteira, que fica a uns 100 m da casa. A escuridão era total e um cheiro forte de raízes
inundava o ar. Lembro de ter pensado no cheiro de cenouras recém colhidas. Só que o cheiro era
muito intenso, de um modo que eu nunca havia sentido antes. Algo muito estranho havia
acontecido. O rio estava cheio e seu barulho estrondoso se sobrepunha aos sons da noite.
No dia seguinte saí por volta das 6h para buscar uns funcionários em Formoso a 6 km da
fazenda. Ao sair da cozinha reparei que a água da “ducha” estava seca e a piscina completamente
barrenta. Não dei muita atenção porque isso costuma acontecer após chuvas fortes, embora em geral
persista algum filete de água, o que não havia naquele momento.
Pouco antes de Formoso há uma várzea que sempre inunda nas enchentes. Nela havia, além
das marcas usuais da cheia da noite anterior, pelo menos cinco árvores de porte razoável deitadas ao
longo das margens do rio, todas inteiras com galhos e raízes. Isso chamou atenção por não ser
comum. Em geral aparecem troncos quebrados, mas árvores inteiras…
Ao chegar de volta à fazenda por volta das 7h saí com o caseiro para ver o que havia
acontecido. A paisagem era desoladora. O riacho onde captamos a água potável que abastece a
propriedade estava irreconhecível. As árvores das margens haviam sido arrancadas “com raiz e
tudo”, restava apenas um atoleiro barrento que cercava as águas também barrentas. Na lama mole
afundávamos até acima da altura dos joelhos.
Logo ficamos conscientes de que estávamos sem água para o consumo. A captação, caixa de
areia e grande parte dos canos foram levados na enchente e desapareceram para sempre. A primeira
providência foi comprar uma bomba de sucção e passar a captar água diretamente do Rio Segredo,
logo acima de onde desaguava a lama. Por sorte na época tínhamos um longo cabo de energia, que
usávamos nas cortadeiras elétricas de grama. A solução foi provisória pois havia um outro ponto
com lama um pouco acima no rio. Mas a água servia para a limpeza, banho e necessidades básicas.
Água potável passamos a buscar em uma nascente próxima chamada “água do boi”, ficamos quase
um ano buscando água nesse local.
Também tínhamos que resolver o problema da água da ducha e piscina. Essa água vem
desde 1850 a partir de um desvio do Rio Segredo. Logo descobrimos que esse desvio estava acima
da outra fonte de lama e aquela água continuava potável. Como o canal que traz essa água passa
dentro do riacho da tromba d’água, essa parte acabou sendo obstruída totalmente. Foi preciso
improvisar “uma ponte” sobre o riacho feita com canos de esgoto de 100mm. Um vão de 16m foi
preenchido por essa ponte improvisada, suspensa em cabo de aço e escorada com bambus gigantes.
A solução foi tão bem sucedida que ainda está funcionando após 12 anos.
Com o retorno da água da ducha, após uns dez dias, passamos a pegar água com a bomba de
sucção diretamente da piscina, fazíamos isso de manhã cedo, na hora do almoço e à noitinha. Uma
solução melhor conseguimos mais tarde levando a captação para além do ponto onde a tromba
d’água se originou, mais acima no mesmo riacho. A solução foi boa, mas vinha bastante areia na
água e numa pressão que não permitia que o sistema fosse fechado. Ficava sempre um cano aberto
desaguando no canal da ducha para que a pressão nos canos se mantivesse em níveis aceitáveis.
Algumas consequências passaram a ser notadas, como manchas de terra em roupas brancas e
o desgaste das torneiras metálicas do jardim pela ação da areia. “Ossos do ofício!” Só conseguimos
trazer a captação para o ponto original 5 anos depois quando a água voltou a ficar limpa. Hoje o
córrego está recuperado e desse ponto de captação provisório restou o caminho que demos o nome
de Trilha da Cascata, devido a uma cachoeira que há um pouco acima daquele local. Dessa cascata
para cima a trilha encontra com a Trilha do Cafezal, mas isso é outra história…
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